Sua
vida era pautada nele. O tom só era possível se os acordes perfeitos fossem na
companhia dele. Os arranjos só eram harmônicos se a melodia viesse dele.
Bateu
tanto na mesma tecla, que desafinou sua esperança.
Planejou
sua viagem sete vezes, arrumou e desarrumou quatorze malas vinte e uma vezes.
Tentou o embarque vinte e oito vezes e desistiu antes das trinta e cinco.
Retirou-se
para um período de descanso. À noite, nem dormia. Aproveitava para ir a um churrasco.
Era a melhor forma de aproveitar os prazeres da carne.
Aos
poucos, uma espessa camada de poeira foi se formando por todas as partes da
casa; as roupas se recusavam a voltar limpas para o guarda-roupa; e o pior: já
não mais brotava comida na geladeira.
Era um
sujeito boa-pinta, encantador, bem-falante, namorador e extremamente econômico.
Apreciava receber presentes, contudo jamais os deu. Na véspera do Dia dos
Namorados, por exemplo, rompia sistematicamente o namoro, com o único propósito
de economizar o presente.
Antes
do anoitecer, o andarilho procurou um abrigo e acomodou-se para dormir. Uma
melancolia já conhecida, mas à qual jamais se habituara, invadia seu coração
desde o começo da tarde.
Mesmo
sem usar relógio nem calendário, era sempre assim aos domingos.
Na
entrevista de emprego, ao explicar o motivo de ter sido tão mal sucedido na
vida, o sexagenário relatou que o Mundo é um cesto de maçãs. Concluiu o
raciocínio informando que fechou os olhos e escolheu as podres em todas as oportunidades
que a vida lhe ofereceu.